A prosa de Sylvia Plath

Quando o assunto é Sylvia Plath, a impressão que tenho é de que o mundo está eternamente aplaudindo a parte poeta dela, enquanto eu convivo com a versão contista. Isso está longe de ser ruim, embora o inegável favoritismo sobre Ariel me pareça às vezes injusto demais.

Em Johnny Panic e a Bíblia de Sonhos – e outros textos em prosa, o ex-marido de Plath, Ted Hughes, reforça essa preferência ao diminuir a qualidade de certos textos em prosa, alegando falta de experiência e domínio de escrita nos primeiros trabalhos da autora.

Como tantas outras coisas que ele já falou ou fez em se tratando de Plath, discordo completamente de Hughes. Sim, alguns contos parecem medianos – cotidianos demais, eu classificaria. Só que esse é um dos melhores aspectos do livro, pois mostra a versatilidade de Plath na escrita.

Primeira parte do índice do livro

As pessoas começam a ler Plath esperando encontrar os traumas, o medo e a tristeza que marcaram os momentos finais da sua vida. A carga negativa realmente é recorrente nas obras da autora, mas seria certo resumir todo o trabalho literário dela a isso?

Li os diários de Plath e posso dizer que existia dentro da autora uma imensa vontade de viver quando era jovem. Os sonhos grandes, o humor fácil, a perspicácia… Parte dessas características é resgatada na nova coletânea de textos publicados pela Biblioteca Azul.

Plath não se prendia a uma única coisa. Ela escreveu contos das mais variadas temáticas, que podem tanto sensibilizar quanto arrancar risadas dos leitores.

Os textos têm o jeito característico de Plath – meio irônico, debochado e sério – de se impor em relação a certos assuntos; por exemplo, alertando sobre o mal da guerra e defendendo a liberdade da mulher para tomar decisões que dizem respeito somente a ela. É por isso que nos deparamos em muitos contos com narradores deslocados do cenário em que se encontram. Eles estão à frente das restrições e do pensamento armamentista da época.

Fotografia de Sylvia Plath

Os contos são bem mais fluidos do que os diários, mas ambos os formatos são essenciais para quem gosta e procura consumir os trabalhos da autora.

Os textos não têm uma resposta clara para o enigma maior: quem foi Sylvia Plath e o que tanto a atormentava? Não há como negar que a escrita dominou grande parte da breve história da autora, mas não diz tudo sobre ela. E nem deveria.

Dúvidas existem, e são elas que nos permitem imaginar inúmeros cenários para Plath, que não pode ser presa à imagem de seus últimos anos de vida. É bom deixar as coisas abertas e dar uma chance para algumas versões até então dispensadas pelo público respirarem.

Sim, Plath mergulhou profundamente na depressão, mas isso não a define. Assim como só ser poeta não a define, e só ser contista também não. Plath foi de tudo um pouco.

Publicado por Diana Cheng

Jornalista, 25 anos. Adora passar horas perdida na narrativa de um bom livro. Além de ler, também se arrisca em escrever textos aleatórios.

4 comentários em “A prosa de Sylvia Plath

  1. Nunca li nada da autora, mas tenho tanta curiosidade! Queria começar com os diários porque esse é um formato que amo (eu mesma sou adepta dos diários desde criancinha hahaha), mas nem sei se é a melhor porta de entrada para a autora

    Seu artigo deu ainda mais vontade de conhecer a autora 💙
    Abraço,

    Curtido por 1 pessoa

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